Glaucio Aranha

No início dos anos 70, na Finlândia, houve um processo de reforma curricular e de treinamento de professores que culminou no enorme sucesso atual do setor educacional do país. Mas o que de fato levou a essa transformação? Segundo Pekka Saalvalainen, que é CEO da Finland University, uma iniciativa que reúne quatro das principais universidades finlandesas (Tampere University, University of Eastern Finland, University of Turku e Åbo Akademi University), o ponto diferencial para a obtenção dos bons resultados conquistados foi ter sido colocado o foco do processo de reforma na figura do professor.

Ao entender a atividade dos professores como central para o processo educacional, a reforma investiu no treinamento e capacitação dos docentes desde a sua formação. Assim, estudantes do curso de pedagogia começam a atuar cedo nas escolas, acompanhando um professor titular e observando o funcionamento das aulas, as dificuldades e como lidar com elas, sendo sempre orientada pelo professor responsável em um sistema de vivência que reproduz a experiência de um mentor e seu aprendiz.

O efeito desta e outras transformações no processo de formação dos professores pode ser visto visto, por exemplo, nos resultados do país no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), no qual a Finlândia se destaca por possuir uma curva ascendente constante, ocupando lugar de destaque entre os melhores desempenhos, desde que adotou a reforma centrada na melhoria da qualificação do professor.

Mas podemos nos perguntar, o que viria a ser, efetivamente, uma formação centrada no professor. Na experiência finlandesa, entendeu-se ser uma priorização da experiência prática. Com isso, o professor responsável pela tutoria dos estudantes de pedagogia monitora o processo de desenvolvimento das habilidades dos formandos em contexto de sala de aula, no processo de mediação de conflitos entre alunos, no desenvolvimento do planejamento curricular, dentre outras atividades. O licenciando não é imerso na teoria para depois aplicá-la, mas vivencia ao longo de todo o curso em um ambiente seguro (acompanhando um professor responsável), aprendendo a se aperfeiçoar diante do feedback imediato e constante do mentor em relação às habilidades que demandam melhoria.

Se o método tradicional foca nos fundamentos teóricos, o método finlandês foca na vivência, na observação participativa. Oportuniza aos licenciandos o desenvolvimento de competências de liderança em momentos específicos do cotidiano escolar, ministrando, por exemplo, uma parte do conteúdo sob avaliação do mentor. Finalizada a vivência, o professor titular (mentor) apresenta seu feedback, com positividade e crítica construtiva e objetivamente orientada. Quando viável, ele pode até mesmo intervir pontualmente, se a situação em curso se mostrar mais rica como oportunidade para apresentar modos e técnicas de melhoria em como lidar com dada situação.

Sala de Aula na Finlândia (Iona Szkurnik/Bússola/Reprodução)

O processo como um todo se desdobra em numerosos outros aspectos, mas em apertada síntese parece razoável destacar que a proposta está edificada sobre: a valorização da experiência prática como recurso de aprendizagem, foco no professor para que sai da faculdade com a maturidade necessário para o desempenho de sua função, organização de grupos de instrutores mentores responsáveis por acompanhar o desenvolvimento dos alunos, ampliação do estágio na função de professor (acompanhando o titular), ocupação da sala de aula como lugar de produção de conhecimento pelo licenciando, formação para a gestão e empreendedorismo a fim de desenvolver competências de liderança e gestão de conflitos.

Obviamente, cada país possui suas especificidades sociais, econômicas, políticas e culturais não sendo viável a mera importação e implantação de um modelo de sucesso em outro contexto na vã esperança de que os resultados serão iguais. Entretanto, o olhar comparativo nos permite reparar soluções ainda não testadas ou, pelo menos, a aplicação com fins de avaliar quais pontos encontram eco e quais precisam passar por algum tipo de adaptação. Sabemos que nossa realidade não condiz com o desejável, mas precisamos testar métodos e adaptá-los, quando possível, para que tenhamos a esperança de que possamos, tal como outros países reformatar a curva de desempenho de nosso sistema educacional.