Flavia Regina Franca de Oliveira

Você já se perguntou o porquê de lembrarmos ou esquecermos o que aprendemos? Você acha que sua memória já foi mais eficiente? Partindo da premissa que a memória eterniza o que gostamos de aprender, é preciso, primeiramente, entendermos como são constituídas as nossas memórias e qual é a relação entre elas e a aprendizagem.

De acordo com Squire (citado por Gazzaniga et al.. 2006), o aprendizado é o processo de aquisição de informação enquanto que a memória corresponde ao processo de manutenção do que foi aprendido de forma que possa ser evocado posteriormente. Isto posto, conclui-se que, para o autor, a memória é construída e reforçada pela repetição. Tal visão encontra eco em Isquierdo (2011), que complementa esta informação no sentido de que o que fica na memória é o que foi aprendido. Deste modo, só lembramos o que “memorizamos”, ou seja, as informações que transformamos em memória. Assim, de maneira geral, o conceito de fazer memória também tem sido ampliado para a “habilidade de adquirir, armazenar e evocar informações” (Wilson, 2011, p.21).

Ao analisarmos as definições de memória e aprendizagem, de acordo com os autores citados, podemos concluir que a construção de memória(s) não seria possível sem a aprendizagem. Diante disso, para que possamos entender como ocorre todo esse processo, é necessário compreendermos, as diferentes etapas para o bom funcionamento da memória.

  • Codificação/Aquisição

Esta é a etapa na qual ocorre a aquisição de informações. Assim sendo, as informações (entradas) declarativas (explícitas) e/ou não-declarativas (implícitas) são preparadas (codificadas) para serem conduzidas às estruturas encefálicas responsáveis pelo seu processamento (aquisição).  Esse processamento, em diferentes níveis corticais, subcorticais e/ou em outras estruturas encefálicas corresponde ao aprendizado das informações, o qual pode ser unimodal, heteromodal, multimodal, etc. Essa aquisição é resultado da formação/remodelagem de circuitos sinápticos (base para a plasticidade sináptica).

  • Armazenamento/Esquecimento

Quando retemos ou perdemos qualquer tipo de informação, o processo de armazenamento é iniciado logo após o registro do estímulo (aprendizagem), podendo se estender por horas, dias, meses e até mesmo anos (memórias ultra-rápida, rápida ou de longa duração). As novas experiências e informações podem estabelecer relações com informações adquiridas anteriormente (modificando ou não esses padrões sinápticos pré-existentes), as quais continuam sendo ativadas e desativadas (repetição da ativação como mola mestra para o processo de armazenagem). As memórias são formadas a partir do processo de reforço sináptico e, consequente (e desejável) consolidação dos mesmos. As redes neurais reforçadas ou enfraquecidas é que determinarão os aprendizados que serão consolidados (reforçados pelo processo de potencialização de curta/longa duração) ou esquecidos (enfraquecimento sináptico com consequente perda daquele padrão, pela atuação do processo de depressão de curta/longa duração). Ou seja , para se ter memória ou perde-la, precisamos fortalecer ou enfraquecer os circuitos sinápticos responsáveis pela informação guardada.

  •  Evocação

Esta é a etapa que diz respeito ao acesso (quase livre) à informação armazenada. Para evocar determinada informação (resultado do fortalecimento de um circuito neural) precisamos ativar tais redes neurais, o que pode ser feito a partir de várias fontes (outros circuitos). Por isso, um aprendizado multimodal, relacional ou que envolva várias fontes para sua formação pode ser evocado a partir de várias origens. É o evocar, justamente, que nos permite recordar o que guardamos. Vale ressaltar que há várias interações entre as etapas aqui descritas. Ressalta-se, ainda, o alerta que Isquierdo (2011) nos faz em relação às formas como as nossas emoções, o nível de consciência e o estado de ânimo interferem no processo de construção/armazenagem/perda/evocação da memória. Deste modo, situações com um forte grau de alerta emocional podem se tornar mais fáceis de serem recordadas. Da mesma maneira, pode ser mais fácil aprender ou lembrar algo quando estamos bem humorados e mais relaxados. A aprendizagem e a memória são a base da plasticidade neural que acompanham o desenvolvimento pedagógico da prática docente.

À vista do exposto aqui, percebe-se que com o atual desenvolvimento das neurociências estamos ampliando nossos conceitos e estratégias pedagógicas, aprendendo que memorizar não se resume à velha e conhecida “decoreba” de conteúdos escolares. Entende-se, portanto, que a memorização ocorre através de atividades concretas, cinestésicas, visuais, orais, leituras e envolvimento em práticas, sendo afetados também por aspectos emocionais e contextuais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

GAZZANIGA, Michael S; IVRY, Richard B; MANGUN, George R. Neurociência Cognitiva: a biologia da mente. Tradução Angelica Rosat Consiglio…[et al]. 2ª Ed. Porto Alegre: Artmed, 2006.

ISQUIERDO, Iván. A Arte de Esquecer: cérebro e memória. 2º Ed. Rio de Janeiro: Vieira & Lente, 2010.

WILSON, B. A. Reabilitação da Memória: integrando teoria e prática. Tradução: Clarissa Ribeiro; revisão técnica: Rochele Paz Fonseca. Porto Alegre: Artmed, 2011.

COSENZA, Ramon; GUERRA, Leonor. Neurociência e educação. Porto Alegre: Artmed Editora, 2011.COSENZA, Ramon; GUERRA, Leonor. Neurociência e educação. Porto Alegre: Artmed Editora, 2011.